Sentimento de solidão diminuiu durante a pandemia, mas quem se sente mais só corre riscos

Sentimento de solidão diminuiu durante a pandemia, mas quem se sente mais só corre riscos

Pandemia, cuidados especiais, isolamento social, filhos não visitam pais, netos não visitam avós… Era de se esperar que mais pessoas, nesse período, manifestassem sentimento de solidão. Mas não foi esse o resultado de uma pesquisa realizada por especialistas da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) com pessoas de 50 ou mais anos de idade. O estudo acaba de ser publicado na revista inglesa Aging & Mental Health.

Desde 2017, a solidão é considerada uma epidemia mundial que afeta a saúde mental, especialmente entre adultos mais velhos. Juliana Torres, a principal autora do trabalho, explica que, durante o período de distanciamento imposto pela pandemia, muitas estratégias para reduzir esse sentimento de solidão (como exercício físico, atividades sociais e trabalho voluntário) tiveram que ser suspensas. A equipe ficou surpresa quando, feitos os cálculos estatísticos finais, constatou-se que 24 entre 100 pessoas (23,9%) indicaram sentir solidão durante o período da pandemia. Antes da chegada do coronavírus, um estudo semelhante indicou que sentiam solidão cerca de 33 pessoas num grupo de 100 (32,8%). Portanto, o sentimento de solidão diminuiu no Brasil.

Na pesquisa atual, quatro foram os grupos com maior frequência de solidão:

  • as mulheres;
  • pessoas com depressão;
  • pessoas residentes na área rural; e
  • pessoas da região Nordeste do país.

Participaram da pesquisa 4431 pessoas de todo o Brasil, entre 26 de maio e 8 de junho, que responderam por telefone um questionário envolvendo comportamentos em saúde, medidas preventivas adotadas e questões subjetivas vivenciadas naquele momento. A partir daí, os entrevistados foram separados em três grupos: os que responderam “quase nunca”, “algumas vezes” e “sempre” me senti sozinho/solitário.

Torres explica que solidão é um sentimento subjetivo. Surge da comparação entre o nível de desejo que alguém tem de manter relacionamentos pessoais e o que de fato ocorre na vida desse alguém. Quanto maior a distância entre o que se deseja e o que de fato acontece, maior é a solidão.

A professora do Departamento de Medicina Preventiva e Social levanta algumas hipóteses para a surpreendente conclusão. Pessoas da família que normalmente trabalhavam fora de casa passaram a desenvolver suas atividades em home office. Outra explicação seria o fato de que é comum no Brasil os mais velhos coabitarem com crianças e jovens. Uma terceira possibilidade é o potencial benefício das ligações telefônicas e conversas por redes sociais.

Embora os números demonstrem algo positivo, a professora chama a atenção para um fato preocupante. De acordo com os resultados da pesquisa, pessoas que se sentem mais solitárias não ficam “satisfeitas” com telefonemas e contatos virtuais e acabam procurando fisicamente seus familiares, amigos e entes queridos. Com isso, elas correm o risco de contrair o coronavírus. Seria preciso encontrar outras estratégias de socialização para essas pessoas, alerta a pesquisadora.

Imagem em destaque: Nick Karvounis/Unsplash

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