Há 100 anos nascia Paulo Freire, brasileiro que influencia a pedagogia em todo o mundo

Há 100 anos nascia Paulo Freire, brasileiro que influencia a pedagogia em todo o mundo

Neste 19 de setembro, há 100 anos, nascia em Recife o pernambucano Paulo Regius Neves Freire, Patrono da Educação Brasileira. Formado em Direito, ele deixou de lado sua formação para se dedicar à educação, tornando-se um dos maiores pensadores mundiais nessa área. Seu método para a alfabetização de jovens e adultos, além de suas ideias e inovações no campo da educação, tem influência na prática pedagógica de muitos países. Com trabalhos reconhecidos nas áreas da Educação, Artes, Ciências e até Engenharia, Freire é o brasileiro que mais recebeu títulos de Doutor Honoris Causa no mundo. Por sua obra, seu centenário é comemorado não só no Brasil.

Segundo Carlos Alberto Torres, professor na Universidade da Califórnia – Los Angeles (UCLA), estudioso da obra e da vida do educador, Paulo Freire é o pensador mais importante da primeira metade do século XX e sua obra Pedagogia do Oprimido – entre mais de 30 outros trabalhos de sua autoria – é o livro mais importante da segunda metade do século passado. Torres é o fundador do Instituto Paulo Freire no Brasil, na Argentina e nos Estados Unidos e já escreveu mais de 50 livros sobre Freire.

Para se ter uma ideia da influência de Freire no cenário mundial, Paulo Freire é o terceiro pensador mais citado do planeta em trabalhos de universidades de humanas no Google Scholar, ferramenta de pesquisa para literatura acadêmica. Pedagogia do Oprimido, por sua vez, traduzido em mais de 30 idiomas, vendeu mais de um milhão de cópias em todo o mundo e é o único livro brasileiro a constar na lista dos 100 títulos mais indicados por professores nas bibliografias das universidades de língua inglesa nos Estados Unidos, Reino Unido, Austrália e Nova Zelândia, pesquisadas pelo projeto Open Syllabus. Em 2020, o livro completou 50 anos de lançamento e, no Brasil, está em sua 65ª edição.

“Em Ciências Sociais, Pedagogia do Oprimido é o terceiro mais citado no mundo inteiro. Em Educação, é o número um. É um texto emblemático, mítico. É uma das etapas de um pensamento muito abrangente, que busca reconstituir a imagem politica da educação, os aspectos epistemológicos da aprendizagem, é um modelo de emancipação“, destaca Torres.

Para o professor da UCLA, Freire é um pensador transformador porque recupera todo o pensamento da área da educação e o aplica na contemporaneidade. Embora não tenha criado um modelo especifico para a educação formal, há adaptações. “Ele criticou a educação bancária, centrada no poder e que incorpora a assimilação de conceitos. A proposta epistemológica de diálogo do Freire é democrática. O ideal é que a educação formal incorpore o Freire”, defende ele. “O que Freire pregou – e por isso é considerado tão perigoso pela extrema direita – é que você não pode manipular a consciência. E se você deseja fazer isso, está correndo um grande risco. A resposta será atos pela liberdade”.

Uma síntese da pedagogia de Freire

De um modo bastante sucinto, Afonso Scocuglia, professor da Universidade Federal da Paraíba e também estudioso da obra de Freire, destaca quatro linhas mestras da pedagogia de Freire.

1. Pedagogia do diálogo – Nas rodas de conversa ou “círculos de cultura” de Paulo Freire, o conhecimento é construído com a participação de todos. Contrariando a ideia de que o saber é transmitido por aquele que sabe mais, ele adotava uma metodologia em que o saber é construído na relação entre educadores e educandos.

2. Educação problematizadora – O questionamento da realidade que cerca o educando e sua participação ativa no processo educacional, empenhando-se em raciocinar, investigar e debater, são os fundamentos da educação libertadora e problematizadora. Ela se opõe à educação tradicional, que Freire chama de “bancária”.

3. Ação transformadora – Freire defendia que a educação deve levar à conscientização e à leitura crítica da realidade do educando, com o objetivo de transformá-la. É a partir do processo educativo que se quebra a “cultura do silêncio” que, segundo Freire, proíbe as classes dominadas de pensar, se expressar e viver plenamente.

Filho de pernambucanos, Paulo nasceu no Recife e passou sua infância no bairro de Casa Amarela, região norte da capital pernambucana. Foi na casa da Estrada do Encanamento, debaixo da mangueira no quintal, onde Paulo teve o primeiro contato com a alfabetização por meio da mãe, dona Edeltrudes. Por causa de problemas financeiros, Paulo e a família se mudaram para Jaboatão, na Região Metropolitana do Recife. Foi ali onde Paulo teve contato com a pobreza e com a fome dos amigos.
A mãe dele ficou viúva e travou uma verdadeira batalha para que o menino estudasse. Ela conseguiu uma bolsa para ele estudar no Colégio Osvaldo Cruz, no centro do Recife. Freire era bom aluno e foi professor da instituição. Foi ali onde Paulo conheceu a primeira mulher dele, a pernambucana Elza Freire, também professora. Crédito: Universidade Federal de Pernambuco

4. Respeito à experiência do educando – Na pedagogia de Paulo Freire, a construção do conhecimento não considera o senso comum, mas parte dele para chegar a um saber mais sólido e crítico. O cotidiano e a experiência são o ponto de partida para o aprendizado e a superação de uma visão ingênua da realidade.

Trajetória

Além da escrita dos livros e da dedicação à educação popular, a trajetória de Paulo Freire inclui a prisão e o exílio na ditadura militar, com passagem pelo Chile, EUA e Suíça. De volta ao Brasil nos anos 80, deu aulas na Pontifícia Universidade Católica (PUC) e na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), assessorou movimentos sociais e foi secretário de educação do município de São Paulo na gestão de Luíza Erundina. Morreu em 02 de maio de 1997.

“Freire defendeu a democracia em meio às lutas sociais na América Latina, nos anos 1960. É um pensador muito comprometido com o democrático, com a luta de classes. O liberalismo existe desde 1980. É um modelo fracassado. O neoliberalismo é baseado no individualismo possessivo. É uma oportunidade para o setor privado expandir e controlar o país, destrói o bem comum”, conclui o professor.

Sugestão de Leitura: O educador. Um perfil de Paulo Freire

Imagem em destaque: Paulo Freire/YouTube

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