Em carta, pesquisadores apontam que atual queima da floresta amazônica põe em risco o futuro do agronegócio no Brasil
Desde o mês de agosto, as queimadas na região Norte do país vêm preocupando pesquisadores e lideranças nacionais e internacionais. Investigações da Polícia Federal (PF) e do Ministério Público Federal (MPF) apontam para indícios de incêndios criminosos realizados para o avanço do agronegócio. A revista Science acaba de publicar uma carta em que pesquisadores da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e da Universidade Federal de Viçosa (UFV) fazem relação entre as políticas ambientais adotadas na gestão do presidente Jair Bolsonaro e os incêndios na região amazônica.
De acordo com eles, é necessário investimento público para o desenvolvimento de tecnologias visando a recuperação de áreas improdutivas em lugar do incentivo ao desmatamento com foco no aumento da produtividade do agronegócio. Conforme destacam na publicação, a redução da cobertura florestal traz impactos negativos à economia, ao ambiente e ao clima, com prejuízo à produtividade do próprio agronegócio.
Assinam a carta o aluno Daniel Arruda, que cursa pós-doutorado no Instituto de Geociências, e Rúbia Fonseca, professora do Instituto de Ciências Agrárias (ICA), ambos da UFMG, e Hugo G. Candido, do Departamento de Solos e Nutrição de Plantas da UFV.
A carta
Fogo na Amazônia ameaça agronegócio
Sob a direção de seu novo presidente, Jair Bolsonaro, o Brasil tem recentemente sofrido uma série de desastrosas mudanças nas políticas ambientais (1), incluindo cortes nas agências do governo responsáveis pelo monitoramento e fiscalização ambiental (2). Encorajados pela pobreza da fiscalização, fazendeiros em busca de mais pastagens proporcionam aumento alarmante no desmatamento e colocam fogo para limpar áreas (3), atingindo áreas protegidas e terras indígenas (4). Queimadas de florestas para criar novas pastagens e plantações são ambientalmente e economicamente insustentáveis.
Aproximadamente 20% da cobertura florestal amazônica já foi perdida e a estimativa é que essa realidade chegue a 40% em 2050 (5). Os ciclos de automanutenção da floresta já estão comprometidos e podem levar a um colapso total da floresta (6). A redução da cobertura da floresta tem impactos econômicos: estima-se que a evapotranspiração da floresta amazônica libere diariamente na atmosfera mais água do que a quantidade liberada pelo próprio rio Amazonas (7). Parte dessa umidade flui para as regiões sudeste, sul e oeste do Brasil, e são responsáveis por 70% do produto interno bruto (PIB) do continente (7). Se a Amazônia não produzir mais chuvas para os cultivos do país, o Brasil terá uma perda estimada em trilhões de dólares nos próximos 30 anos (8). Para o mesmo período, as projeções mostram reduções na produção de soja em 25 a 60% e reduções na produtividade das pastagens em 28 a 33% (9).
Cerca de 24% do PIB do Brasil vem do agronegócio (10). A guerra comercial entre os Estados Unidos e a China aumentou a demanda por commodities brasileiras e, por sua vez, impulsionou o desmatamento na Amazônia (11). No entanto, devido as atuais políticas ambientais do Brasil divergirem dos interesses da União Europeia, a demanda por exportações pode diminuir, ameaçando a sustentabilidade econômica do agronegócio.
O Brasil precisa investir em tecnologia para recuperar áreas improdutivas, em vez de desmatamento para manter o aumento da produtividade (12). Por isso, é vital para a economia brasileira, bem como para o meio ambiente, que os produtores de grãos e carne do Centro-Oeste, Sudeste e Sul se unam contra as atuais políticas ambientais e exijam treinamento e tecnologia, em vez de anistia por crimes ambientais.
Obs – Os números entre parênteses indicam referências bibliográficas e notas que dão suporte ao texto.
Em destaque – Foto aérea da queimada do Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros – Alto Paraíso de Goiás (Valter Campanato/Agência Brasil)