Estudiosos do coração já não estão vendo o leite como o vilão da história

Do mesmo modo que no caso do ovo, antes apontado como um alimento que faria mal, os estudiosos do coração estão concluindo que o leite não é o vilão que eles mesmos indicavam ser. Pesquisa publicada em 24 de maio no International Journal of Obesity envolvendo mais de 1,9 milhão de pessoas não encontrou relação de causa e efeito entre o consumo regular de leite e o registro de altos níveis de colesterol. Pelo contrário. De acordo com Karani Santhanakrishnan Vimaleswaran e seus colegas da Universidade de Reading, na Inglaterra, as pessoas que beberam regularmente grandes quantidades de leite apresentaram níveis mais baixos de colesterol bom (HDL) e ruim (LDL) e risco 14 por cento menor de sofrerem doença cardiovascular.

Esta nova pesquisa foi realizada depois que vários estudos que se propuseram a investigar a ligação causal entre a maior ingestão de laticínios e doenças cardiometabólicas, como obesidade e diabetes, chegaram a resultados contraditórios.

Alimento complexo

“O leite é um alimento relativamente complexo e, além do cálcio, os produtos lácteos constituem uma importante fonte de proteína e, principalmente, de gordura saturada”, explica Karani. “Vários estudos no passado investigaram a associação entre o consumo de laticínios e fatores de risco cardiovascular. No entanto, a maioria deles se concentrou na comparação de diferentes tipos de leite (ou seja, baixo teor de gordura versus alto teor de gordura), embora existam poucos estudos investigando os efeitos do leite em si. Além disso, a maioria dos estudos envolvia pouca gente, com curta duração e carecia de grupos de controle adequados, controle da composição alimentar, além de outros fatores. Por exemplo, um estudo cruzado de alimentação em oito homens mostrou que os níveis de colesterol ruim foram 7% e 11% menores, respectivamente, após 6 semanas de consumo de uma dieta com baixo teor de gordura controlada contendo leite desnatado, em comparação com o leite integral, sugerindo que a redução do consumo de gordura do leite é que teria levado a perfis mais favoráveis de lípides. Outras pesquisas também mostraram que o leite desnatado parece ter vantagens na redução dos níveis de colesterol em relação ao leite integral. No entanto, essas pesquisas não apresentaram efeito sobre os triglicerídeos séricos. Experimentos que compararam o efeito de quantidades isoenergéticas de leite, queijo e manteiga nos resultados de lipídios mostraram que a concentração de colesterol total foi significativamente menor após a dieta com queijo do que com manteiga; porém, um efeito diferencial da gordura no leite e na manteiga não foi confirmado. Ainda cito alguns estudos de coorte prospectivos que não conseguiram mostrar que a ingestão mais elevada de leite e produtos lácteos, independentemente dos níveis de gordura do leite, está associada a um risco aumentado de desfechos relacionados a doença cardiovascular. Como se vê, os resultados são muito controversos. Ainda não está claro se é o teor de gordura nos produtos lácteos que está contribuindo para os níveis mais baixos de colesterol ou se isso acontece devido a um ‘fator do leite’ ainda desconhecido”, argumenta.

“O estudo que realizamos certamente mostra que o consumo de leite não é um problema significativo para o risco de doenças cardiovasculares, embora tenha havido um pequeno aumento no índice de massa corpórea (IMC) e na gordura corporal entre os bebedores de leite”, conclui Karani.

O artigo original:
Vimaleswaran, K.S., Zhou, A., Cavadino, A. et al. Evidence for a causal association between milk intake and cardiometabolic disease outcomes using a two-sample Mendelian Randomization analysis in up to 1,904,220 individuals. Int J Obes (2021). https://doi.org/10.1038/s41366-021-00841-2

Imagem em destaque: Unsplash/Wolfgang Rottmann

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