
E se as palavras pudessem trançar mundos tão habilidosamente quanto mãos entrelaçam cabelos?
Eliane Marques, voz icônica da literatura contemporânea, confessa: “Eu escrevo porque não sei fazer tranças…”. Mas será que sua escrita, longe de ser uma compensação, desvela um poder ainda maior? Em Sílex, a poeta não apenas entrelaça palavras — ela as torce, estica e reinventa, criando tramas que deslocam significados e embaralham sentidos. Sua linguagem é uma serpente em movimento, como Qán, divindade maia que abre o livro, deslizando entre temporalidades para fundar mundos novos. Nas seções seguintes, a serpente transforma-se em Dán, da tradição jeje, enquanto a poeta recria mitos e dissolve fronteiras entre o íntimo e o desconhecido.
Não há acaso aqui: cada verso é uma percussão, um ritmo que ecoa no corpo e na mente. Marques lambe, desmonta e remonta a língua, consciente de que “o cômputo dos destroços termina nunca”. Sua voz política não grita — sussurra através de metáforas, convidando o leitor a desbravar ruínas e renascer nelas. Como resistir ao chamado dessa trança linguística que une ancestralidade e futuro?
Nas livrarias a partir de 03 de março.