Política econômica está fazendo Brasil caminhar para trás, alerta grupo da UFMG
Enquanto a Europa e os Estados Unidos se planejam para crescerem investindo em pesquisa que gere tecnologias verdes, o Brasil gasta cada vez menos em ciência e tecnologia, focando na exportação dos bens primários e extrativos. Ao concentrarmos nossos investimentos na produção de bens primários, a possibilidade do crescimento verde fica cada vez mais distante. O alerta é de João Prates Romero, professor do Departamento de Ciências Econômicas da FACE (Faculdade de Ciências Econômicas) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). De acordo com ele, “a continuidade de políticas que priorizem o capitalismo predatório em detrimento do avanço em setores mais tecnológicos e mais limpos, além de gerar maior degradação ambiental, pode ser um entrave para o nosso desenvolvimento. É urgente que o Brasil deixe de andar na contramão do mundo”.
O cenário preocupante deriva do exposto em Mudanças no padrão de exportação brasileira entre 2016-2020. O Brasil na contramão do mundo, nota técnica assinada pelo Grupo de Pesquisa em Políticas Públicas e Desenvolvimento (GPPD), do Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional (Cedeplar) daquela universidade.
No estudo, Romero e seus colegas mostram que, ao contrário da Europa e dos Estados Unidos, o Brasil está seguindo uma estratégia de crescimento focada em setores primários e baseada em recursos naturais. Essa estratégia, associada a uma maior emissão de gases de efeito estufa e maior degradação ambiental, ocorre em detrimento das exportações de produtos resultantes de setores de maior intensidade tecnológica e que gerariam maior crescimento econômico e menos impacto no meio ambiente.
No período estudado, a exportação de produtos primários, que inclui a madeira bruta e o ouro, por exemplo, aumentou de 37,2%, em 2016, para 44,3%, em 2020. No caso da madeira bruta, as vendas aumentaram 542% desde 2016. A quantidade de ouro exportado, por sua vez, subiu 30% entre os anos de 2018 e 2020, gerando, assim, o alerta de que parte desse aumento possa ser oriundo de atividades ilegais e de degradação ambiental, principalmente no norte do país. No caso dos produtos de média tecnologia, ao contrário, a exportação caiu de 20,2% para 14,2%. E, em se tratando dos produtos de alta tecnologia, a queda foi de 5,2% para 3,1%.
Os setores de média e alta tecnologia incluem as indústrias de máquinas e equipamentos mais sofisticados, além das fábricas de produtos químicos e farmacêuticos, aeronaves, aviões, veículos automotivos, caminhões etc. Trata-se de um setor que exige maior uso de conhecimento científico e de pesquisa na produção.
Nesse terreno, o Brasil vem perdendo competitividade. O estudo do Cedeplar indica que, num universo de 999 indústrias, o Brasil tinha 196 indústrias competitivas em 2016, número que caiu para 167 em 2020. A quantidade de produtos competitivos aumentou somente no grupo de produtos primários, passando de 47, em 2016, para 49, em 2020.
Para chegar a essas conclusões, o grupo fez uso de informações do UN Comtrade, um banco de dados comerciais globais. Tal mudança no perfil exportador brasileiro mostra, segundo Romero, que o país está fazendo o caminho oposto ao das nações mais ricas do mundo. “Isso é negativo para a nossa economia. Os setores de maior intensidade tecnológica são os que geram empregos de melhor qualidade e os mais dinâmicos. A demanda tende a crescer mais rápido e, por isso, exige maior capacidade produtiva. A redução da participação desses setores no perfil exportador do Brasil mostra que estamos perdendo capacidade produtiva e que há uma tendência de o país crescer mais devagar, gerando empregos de pior qualidade e com menos contribuição para nossa produtividade. Por isso é tão preocupante exportarmos mais produtos primários e menos produtos de maior intensidade tecnológica”, conclui.
O professor destaca que a estratégia assumida pelo governo federal é responsável pela perda de competitividade e de diversificação da produção nacional. De acordo com ele, essa perda pode ser sanada com o aumento do investimento em ciência e tecnologia.